sexta-feira, 6 de abril de 2018

EU, MICHAEL

EU, MICHAEL
Michael Barrett
1994

"... no fundo, quem sou eu?... Quem sou eu, senão um SER atormentado, como todos os homens, que não quer senão pintar, que só não é medíocre, pintando? Quem sou eu, senão alguém que sonha com dias cada vez melhores, para ele, para a sua família e amigos e para a sua pintura, a sua maneira de falar, de comunicar e de estar na vida? No fundo, quem sou eu?.,." O meu nome é Barrett. Michael Barrett. 
Nasci em Paris em 1925, fruto da união de uma senhora inglesa com um senhor francês, que nunca cheguei a conhecer, facto que me marcou e influenciou o meu comportamento, a minha personalidade e até a minha pintura. 
Aos 8 anos encontrava-me em Barcelona, acompanhado por minha mãe e avó, quando eclodiu a guerra civil de Espanha. Passado algum tempo mudámo-nos para Seats, perto de Barcelona, e a guerra encontrava-se no auge. Fomos evacuados por um navio de guerra inglês e levados até Marselha. Lá, por decisão materna, embarcados para Portugal num navio holandês.
Vivemos em Lisboa, depois no Estoril, depois em Cascais e finalmente em Buarcos (Figueira da Foz), onde resido actualmente.
Tinha, pois, 9 anos quando cheguei a Portugal, sem saber uma palavra de português! Como não gostava de ficar em casa - para grande desgosto de minha mãe - fui-me habituando aos miúdos do bairro, pelo que posso afirmar que a minha base cultural da língua portuguesa foi a rua! 
Mais tarde estive no "Julian School" durante quatro anos e meio, mas como fui sempre um péssimo aluno, a minha mãe resolveu tirar-me de lá, tendo-me arranjado um professor particular que me ensinava o português, matemática, geografia, história, etc.. Tive portanto uma educação formal muito limitada, e até aos vinte anos pouco mais fui do que um "playboy", na Costa do Estoril. Nessa altura comecei a trabalhar numa companhia, como intérprete; depois fui tradutor, por uns meses, na TWA; mais tarde, caixeiro viajante, tendo-se seguido vários outros empregos temporários, até que trabalhei numa firma distribuidora de filmes, onde fui friamente explorado, tendo-me então decidido a nunca mais ter patrões! 
Um dia, numa conversa de café, um amigo de Cascais - o arq. Gil Graça - sugeriu-me que dedicasse os meus tempos livres a pintar, e dispôs-se mesmo a arranjar-me um bloco, uns lápis e umas tintas. Eu que me considerava uma nulidade em matéria de arte - devido à "falta de jeito para o desenho, que me obrigava, quando aluno do colégio St. Julian" a pedir ajuda aos meus colegas - achei a ideia absurda e nunca mais voltei a pensar no assunto. Alguns dias depois, cumprida a promessa que me fizera, o arq. Gil Graça, apareceu em minha casa munido do material indispensável à pintura e para meu espanto, algumas semanas mais tarde, já me encontrava a trabalhar numa aguarela, em frente à baía de Cascais e - assombro! -não me estava a sair tão mal como isso!... Foi o princípio da minha "viagem" à descoberta da pintura, de mim mesmo e dos outros.
Mas, a vida continuou a desenrolar-se, paralelamente às minhas descobertas no campo artístico e, algum tempo depois de ter conhecido uma senhora sueca, casávamo-nos; tempo depois a família aumentou com o nascimento do Niki - João Nicolau - e finalmente com a vinda da Teresa Cristina. Apesar de nem eu nem a minha esposa possuirmos nacionalidade portuguesa, ambos o éramos por opção. Apesar de estrangeiros, os nossos filhos viveram e cresceram aqui e hoje são portugueses de nascimento e de coração. À parte de alguns interregnos mais ou menos involuntários e a par com o desenvolvimento e crescimento da família, evoluía a minha pintura e se no início eu era "uma pessoa que pinta" hoje sinto-me pintor.

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Michael Barrett, Um Génio Marginal